A 1 de Dezembro celebra-se a Restauração da Independência de Portugal que, em 1640, pôs fim à dinastia espanhola neste país.
No contexto da esgrima na península Ibérica, desde 1587 que Don Jerónimo de Carranza, com a sua obra “Filosofía de las Armas”, conseguiu criar uma nova forma de praticar a esgrima, intitulada “La Verdadera Deztreza”, tratado que se impôs e fez esquecer tudo o que havia antes, considerando a esgrima do passado como “antiga” ou “vulgar”. Esta nova esgrima dedicava-se quase exclusivamente a espadas manejadas a uma mão, um processo que estava já a acontecer por toda a Europa.
No entanto, não lhe tirando o mérito, fez provavelmente esquecer um tipo de esgrima mais antiga, com armas a duas mãos e que tratava de situações diferentes do duelo um contra um.
Em 1651, Dom Diogo Gomes de Figueiredo, General de Artilharia português e mestre de esgrima, escreveu um manual de esgrima com espadas a duas mãos (o montante) que, calcula-se, tentava um pouco reviver essa esgrima mais antiga, olvidada pela obra e expansão da esgrima protelada pelo mestre espanhol. Dom Diogo Gomes de Figueiredo não só bem conhecia a Verdadera Destreza, pois também era mestre de esgrima, como também a antiga esgrima, com armas a duas mãos, e outras situações que tratava esta esgrima vulgar. E foi sobre essa esgrima já no seu tempo a cair na obscuridade, que decidiu tratar no seu manual.
As situações de combate a que se referiu são as de combate em inferioridade numérica. Como exemplo deixo aqui algumas situações referidas no manual de Dom Diogo:
“He esta regra para brigar com gente por detraz e por diante (…)”
“Serve esta regra para brigar em hua rua larga com gente por detras o por diante (…)”
“Serve esta regra para deter gente em hua rua e impeder que não passe de hua parte para a outra.(…)”
Estas são as situações tratadas também, e muito extensivamente, no jogo do pau português, no chamado jogo do norte, que retrata o combate em inferioridade numérica, estando geralmente cercado de adversários. E este é também o tema do primeiro manual verdadeiramente de jogo do pau de 1886.
Assim, Dom Diogo Gomes de Figueiredo, movido provavelmente pelo renascer de uma nação, reflecte uma quase perdida arte de combate. Este seu trabalho não chegou infelizmente a ser publicado, e a esgrima de espada evoluiu inevitavelmente para a que conhecemos hoje, mas as situações tratadas por este autor sobreviveram na esgrima do varapau sendo praticado até aos dias de hoje, uma prática quase esquecida em outros tipos de esgrima, seja europeia ou de outras partes do mundo.
Outros autores, mas muito poucos, trataram deste tipo de esgrima a duas mãos, contra vários adversários, sendo esta obra um elemento essencial entre não mais que duas ou três outras, que nos permite perceber que a prática actual do jogo do pau não foi uma invenção recente, dos últimos 2 séculos, sendo já uma prática comum muito antes de termos conhecimento do jogo do pau como é conhecido na literatura desde o século XIX.