Jogo do pau – A origem do Ginásio Clube de Mafamude

Pode-se começar esta história da forma que eu me recordo de meus pais e avós me contarem histórias umas maravilhosas com personagens de sonho e encanto, enfim de adormecer, outras de recordar episódios passados e presentes, essas em média eram contadas a mesa, local privilegiado onde as famílias a hora sagrada da refeição, falavam e lembravam os seus, e os que já tinham partido para o Pai.

Pois bem, também vou contar uma história, para ser mais exacto, resumir a história do Ginásio Clube de Mafamude e falar dos homens que do nada e do muito pouco que possuíam, deixaram-nos este legado que é o Ginásio Clube de Mafamude.

Tudo começa no mês de Agosto de 1931.

Um grupo de homens de raiz popular, operários e lavradores de Gaia, adeptos e cultores do Jogo do Pau, reúnem-se diariamente no Largo da Feira (Largo de Estevão Torres) num, dos muitos bancos de pedra que existiam, e decidem delinear a base de constituição de um Grupo Popular que cultivasse o Jogo do Pau e o ensinasse às gerações mais novas para que os vindouros soubessem da existência desta arte de defesa pessoal.

Estava encontrada a vontade de se criar o grupo, faltava escolher o local. Por sorte nossa foi escolhida a Freguesia de Mafamude como sede do Grupo.

À cabeça da iniciativa, e segundo algumas fontes ainda vivas que o relatam, é o Mestre Beirão quem lidera o processo. Francisco Pereira é o Mestre Beirão, mestre na antiga fábrica de cerâmica do Carvalhido: é um homem possante, de uma boa constituição física, é um dos mentores e mestre do Jogo do Pau. È secundado pelo Armindo Cabreiro e o Neca Salsa ambos do lugar do Agueiro. Também o António Carmo, policia sinaleiro no PORTO, o Mário Cruz de Cravel e o Belmiro Ferreira tipógrafo da Rasa de Baixo.

O Neca Saraiva tipógrafo a trabalhar na Casa do Povo no Porto, é o cérebro desta organização, que agora vai dar os primeiros passos. È este homem que tem por missão tratar de toda a burocracia inerente à constituição do futuro GINÁSIO CLUBE DE MAFAMUDE.

Deste modo, e graças ao trabalho destes e de outros homens em Setembro de 1931 é criado um novo clube em Vila Nova de Gaia. Tinha nascido o Ginásio Clube de Mafamude, clube vocacionado para a pratica e ensino do Jogo do Pau. Em 1933 é feito o pedido pelo Presidente Sr. Francisco Pereira para a legalização do Ginásio Clube de Mafamude junto do Governo Civil do Porto, pedido com a data de 22 de Fevereiro do ano de 1933, sendo-lhe concedida a autorização pretendida. Encontra-se este documento no Livro de Portas do Governo Civil do Porto com o nº 7419.

A prática, treino e local de estar é a loja do PINTO, um barracão nas traseiras de um estabelecimento que se encontrava na junção da Rua do Telhado e Rua Soares dos Reis. È a sede do Ginásio Clube de Mafamude, uma construção precária, mas que servia os intentos deste jovem criado Clube.

Com o tempo este grupo de jogadores do pau foi-se enraizando no local, as demonstrações desta arte de defesa pessoal foram-se sucedendo, os diversos locais por onde estes praticantes do Jogo do Pau vão passando e se exibindo, deixando os espectadores com vontade de praticarem esta arte, e encantados com a beleza e destreza deste jogo.

Foi tal a fama destes jogadores do Pau que por intermédio do Diplomata Português Sr. Mário Duarte, que, os jogadores do pau do Ginásio Clube de Mafamude tiveram a honra de serem chamados a deslocarem-se a Cidade de LA GUARDIA na festa de inauguração do campo de futebol, onde teve lugar um jogo de futebol entre as equipas do Celta de Vigo e o Real Espanhol de Barcelona, jogo precedido de uma exibição do jogo do pau.

A loja do Pinto desaparece e em 26 de Março do Ano de 1949 é feito um contrato de arrendamento com a extinta firma Bosch & Baylina de um salão de festas com entrada pela Rua do Telhado N.º 265 em Mafamude, Vila Nova de Gaia. (…)

– O Ginásio Clube de Mafamude deixou de ter jogo do pau, mas continuou a suportar muitas outras actividades, no entanto fica aque o registo da sua origem, nascido pelas mãos de jogadores de pau.

recolhido de: http://gcm.blogs.sapo.pt/arquivo/2006_01.html

Jogo da Lança ou Pique

Neste “Methodo de manejar o pique ou lança“ de 1809, o autor descreve a sua técnica ao longo do livro como jogo do lança, ou pique, do mesmo modo como chamamos de “jogo” ao jogo do pau. Sendo que esta utilização é tecnicamente diferente do jogo do pau, quer pela diferença das armas, quer da aplicação, militar e em formação de guerra. No entanto é interessante ver a utilização da expressão “jogo” como manejo de armas, e não como “arremesso” ou “brincadeira/jogo de desporto”, como é utilizada hoje em dia.

Faz também uma referência ao jogo do pau, e em como a lança é superior ao pau:

“Muita gente pelo pouco conhecimento, que tem deste jogo(da lança ou pique), assentará que é o mesmo manejar a lança, ou pique que jogar o pau, por alguma semelhança que lia em algumas posições; porém é tanta a diferença, que pelo uso desta arma nos dará  toda a razão ; e todo aquele que estiver bem certo, e ágil no manejo que temos dito, verá a muita vantagem que tem sobre o Atirador do pau, e quanto este trabalha descoberto.”

Aqui o autor destaca a vantagem de utilizar uma lança, o que faz sentido, pois a ponta de ferro, tornando o varapau mais letal, transforma-o numa arma superior.

José Pinto d’Azevedo, era um morgado desta freguesia, e pessoa de muita nobreza.

O pároco de então, era homem de génio irascível, e tendo certas desavenças com o morgado, receando a sua vindicta, abandonou a freguesia e fugiu para a sua terra.

O povo estimava o pároco, e reunindo-se, no dia 21 de Abril de 1793, marchou para a terra do pároco; mas, no caminho, lhe saiu o morgado, ao encontro, armado de uma espingarda, e perguntando onde ia toda aquela gente, um da turba lhe falou inconvenientemente, e o morgado o matou com um tiro. O povo então, exasperado, matou o assassino, à paulada.

Ambos os mortos foram enterrados no dia seguinte; ficando 48 pessoas culpadas. Ainda hoje é aqui este facto recordado com horror.

“Portugal antigo e moderno” Volume 8 – 1878

…caminhos, festas, feiras e romarias distingue-se e prima pela arte no jogo do pau útil à sua defesa, do inimigo imprevisto. Todo o Barrosão sabia jogar uma ponta de pau. Antes das armas brancas usou-se o pau, que a G.N.R. partia e tirava nas festas e feiras da vila de colmo que era Montalegre.

 “Crenças e tradições de Barroso” António Lourenço Fontes -1992

Hey friend(s), I’m curious about the tradition of wood; Is there any particular tree used to make your pau? and what are your practioners referred to as?

Hi, we use mostly lote (Celtis australis ) and quince (Cydonia oblonga) but lote is easier to get, somewhat flexible so it doesn’t break as often and last longer.
Traditional name for fighters is “puxadores“ but that was used in a time when jogo do pau was still used for practical reasons, right now we call simply jogadores de pau, that I translate as staff fencers.

O Cinematógrafo Português

Aurélio Paz dos Reis, pioneiro do cinema em Portugal realizou no século XIX vários quadros que são dos mais antigos registos de vídeo realizados na nossa terra, um dos quais era o “Jogo do pau”, que parece ter tido grande exito com o publico.O espectáculo de apresentação decorreu a 12 de Novembro de 1896 (Porto, Teatro do Príncipe Real). Notícias na imprensa:

O Primeiro de Janeiro:

  • «Hontem apresentação do kinetórgrapho português, pelo Sr. Aurélio
    Paz dos Reis teve êxito completo. Tanto as vistas estrangeiras como as
    nacionais, d’estes principalmente «O jogo do Pau» e a «Saída das
    Costureiras da Fábrica Confiança» foram acolhidas com grandes salvas de
    palmas».

O Cavaleiro e o Peão

É curiosa esta época ( séc. XIII / XIV ), pela porfiada luta, travada entre o armamento do cavaleiro e o do peão. Este ultimo não podendo equiparar-se ao primeiro na armadura, já pela escassez de meios, já pela necessidade de conservar a agilidade indispensável para as marchas e para combater a pé, desforrava-se nas armas de arremesso, e ainda mais nas de fuste, as quais nesta época passam por uma verdadeira transformação.

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Principia aqui essa longa serie de armas formidáveis nas mãos vigorosas da peonagem rude — armas que tiveram todas a sua esgrima especial, e de cuja eficácia poderá julgar o leitor que tiver, em algumas das nossas feiras ou festas campestres, visto como o guapo valentão sabe varrer o terreno, abrindo caminho com os sarilhos do seu varapau.

“Armaria” – 1885 David Corrazi – Editor.
https://archive.org/stream/armariaillustrad00lisb

A espada a duas mãos – A forma como é utilizada atualmente, com uma guarda com um comprimento de quatro mãos ou mais, é mais adequada, não tanto ao combate um contra um, mas, pela sua habilidade, como um galeão cercado de galés, por si só, a opor-se a várias outras espadas ou diferentes armas. (…) é comum o seu uso em cidades, de dia ou de noite, sempre que um possa ser atacado por vários. Devido ao seu peso, que requer grande força, é utilizada pelos mais fortes de braço e de coração. Estes homens, vendo-se a ter que defrontar vários outros, por segurança e para aterrorizarem os seus adversários com a fúria da sua arma, fazem ataques com longos cortes, trazendo a espada a fazer um circulo completo, ora colocando o peso sobre um pé ora sobre outro, sem se preocuparem de todo em fazer pontuadas, pois segundo a sua opinião, os ataques de ponta apenas afetam um único homem, enquanto um corte, consegue lidar com vários.

Giocomo DiGrassi 1570 (via thescholarsruminations)

Se esgrime el palo en la provincia de Santander y montañas de Leon, en el principado de Astúrias y en algunas comarcas de Galicia.
En Francia en Auvernia y en el Franco-Condado.
En Portugal en la Beira alta e baja.

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“Arte de esgrimir el palo” Liborio Vendrell y Eduart – 1881

O amor, nas provincias septentrionaes, é um elemento obrigado de animação e de vida nos arraiaes populares. Abundam, como aqui se diz, os «conversados» ou, como nós dizemos no sul, os «namorados.» Cada rapaz, apoiado ao seu varapau, «conversa» com a namorada durante longas horas, umas vezes em verso, outras em prosa, quando nào é, alternadamente, em prosa e verso. E esse varapau representa uma espécie de estacada para conter em respeito os espectadores. Ai d’aquelle que se atrever a aproximar-se dos dois namorados e a intrometter-se no seu dialogo. Se o fizer, apanha immediatamente uma sova ;
é quasi sempre esta a causa das maiores desordens nas romarias do norte.

“Sem passar a fronteira”  Alberto Pimentel (1902)

Portugal entre a Monarquia e a República

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em “O Século Cómico” 10/2/1919

Viagem Atribulada
O nosso amigo e bem conhecido almocreve José da Rita, que costuma de feira em feira fazer a sua venda de artigos miúdos, como pentes, botões, suspensórios, gravatas, lamparinas, etc, transportados no seu jumento branco, dirigiu-se há dias ao mercado da Aldeia Nova do Cabeço, Descarregou o burro, desenrolou o pano da barraca e armou-a num abrir e fechar de olhos, depois do que lhe colocou no topo a bandeira nacional.

Mal, porém, a tinha arvorado, eis que sobre a barraca começaram a chover pedras sobre pedras, e logo um grupo de pessoas mal encaradas se adiantou gritando:

 -Morra o José da Rita! Morra!

 O nosso homem, pálido como um morto, indagou:

 -Que fiz eu?

-Pois você não sabe que está aqui proclamada a monarquia? berraram.

Não lhe valeu tirar a bandeira a toda a pressa. O real grupo de trauliteiros da dita aldeia atirou-se a ele como a centeio verde e o pobre José da Rita só deveu ás boas pernas da besta o poder escapar-se e dirigi-se á feira de Cheira Ventos da Banda, a três léguas dali, onde contava desforrar-se do fraco negocio que fizera na Aldeia Nova do Cabeço.

Chegou, tirou os alforges e espetou os paus para a barraca e, já escaldado, coseu rapidamente um bocado de pano cru a outro de fazenda azul, conseguindo desse modo uma bandeira azul e branca, que sem demora prendeu a uma das estacas.

Bandeira, contudo, não era posta, quando quatro bombas lhe estoiram ao pé e de todos os lados correm caceteiros, em grita_

– Ó seu maroto!! ó seu talassa! Aqui é Republica!

Foi um milagre o José da Rita escapar e poder apresentar-se no dia seguinte no mercado de Freixo-de-Sabre-à-Rétaguarda. Chegar, armar a barraca e desfraldar de novo a bandeira republicada, foi obra de meia hora, finda a qual Freixo em peso lhe saltava no galinheiro aos vivas à monarquia …

À hora em que escrevemos, José da Rita, que percorreu mais sete feiras com êxito igual, está de vinha de alhos e o jumento satisfeitíssimo e bendizendo as perturbações políticas que ora afligem a sociedade portuguesa.