Regra de combate em inferioridade numérica, em manual de esgrima do século XVI de um autor natural de Santarém.
Bastante similar ao que muitos grupos de jogo do pau fazem, na pratica do jogo do meio.
“Arte de Esgrima”, Domingo Luís Godinho – 1599
“10ª Regra – Cercado, numa praça, campo ou rua.
É preciso ter muita agudeza, agilidade e um grande brio, quando numa batalha nos encontramos cercados de adversários.
Logo, celeremente segure o montante*1 pela forma da 3ª Regra*2, e, estando no meio deles, com os joelhos dobrados, a cabeça direita, fixado no pé esquerdo, corte um talho*3. Seguindo com o pé direito, corte outro talho, de forma a ir andando de lado, ora sobre o pé esquerdo, ora sobre o pé direito, e vá dando talhos em roda viva, cingindo todo o corpo em roda com o montante. Dá-se a cada passo um talho, que poderão ser até três ou quatro, mas que não devem passar de cinco, pelo perigo que há em desfalecer a cabeça. Acabados estes passos, dados com talhos, volta-se para o lado em que se começou, com outros passos, desta vez dando revezes*4. Da mesma forma que os talhos, dá-se um revés em cada passo do pé, rodando todo o corpo com o revés.
É de notar que quando se segue rodando, com os ditos golpes, os pés deverão ser colocados com segurança, e mais, devem ser colocados direitos, estando sempre um ou outro fixo, e andando com o corpo sempre muito direito. Com a cara, ora olhando para um lado, ora para o outro. E desta forma, ora com passos de talhos, ora de revezes, a um lado e a outro, se dará tantos passos enquanto dure a batalha.
Adverte-se, que se se estiver cercado em campo aberto, os passos não devem ser dados sempre ao mesmo lado, volta-se ao sitio onde se começou, mas continuando a dar passos, ora a um lado ora a outro, fazendo todo o circuito numa roda.
Se for o caso de se estar numa rua larga, neste caso devem-se dar passos a um lado e ao outro, e é de advertir que não devem haver pontuadas.
Caso haja necessidade de romper o esquadrão inimigo que nos cercou, dever-se-á carregar, com passos, sobre a parte onde se vir maior fraqueza. E aproximando-se com um brado para fora, juntamente dar-se-á uma ponta com as unhas para cima, um grande salto em roda, e no fim da ponta, um talho e um revés. Estando de fora, pode-se aproveitar para fazer a 9ª Regra.
Como aviso, quando se está cercado, deve-se sempre carregar ao lado onde os adversários tiverem mais força.”
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1- Espada grande, que se segura a duas mãos, geralmente com um pouco mais de metro e meio.
2- Guarda alta do lado direito da cabeça, com a ponta para trás.
3- Pancada enviesada pela direita.
4- Pancadas enviesadas pela esquerda.
Texto adaptado para português actual.
Para saber mais sobre o autor e a esgrima Ibérica antiga, consultar http://www.spanishsword.org
“Arte de Esgrima” – Luís Godinho, 1599 – Editado recentemente por: http://www.ageaeditora.com/