Portugal entre a Monarquia e a República

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em “O Século Cómico” 10/2/1919

Viagem Atribulada
O nosso amigo e bem conhecido almocreve José da Rita, que costuma de feira em feira fazer a sua venda de artigos miúdos, como pentes, botões, suspensórios, gravatas, lamparinas, etc, transportados no seu jumento branco, dirigiu-se há dias ao mercado da Aldeia Nova do Cabeço, Descarregou o burro, desenrolou o pano da barraca e armou-a num abrir e fechar de olhos, depois do que lhe colocou no topo a bandeira nacional.

Mal, porém, a tinha arvorado, eis que sobre a barraca começaram a chover pedras sobre pedras, e logo um grupo de pessoas mal encaradas se adiantou gritando:

 -Morra o José da Rita! Morra!

 O nosso homem, pálido como um morto, indagou:

 -Que fiz eu?

-Pois você não sabe que está aqui proclamada a monarquia? berraram.

Não lhe valeu tirar a bandeira a toda a pressa. O real grupo de trauliteiros da dita aldeia atirou-se a ele como a centeio verde e o pobre José da Rita só deveu ás boas pernas da besta o poder escapar-se e dirigi-se á feira de Cheira Ventos da Banda, a três léguas dali, onde contava desforrar-se do fraco negocio que fizera na Aldeia Nova do Cabeço.

Chegou, tirou os alforges e espetou os paus para a barraca e, já escaldado, coseu rapidamente um bocado de pano cru a outro de fazenda azul, conseguindo desse modo uma bandeira azul e branca, que sem demora prendeu a uma das estacas.

Bandeira, contudo, não era posta, quando quatro bombas lhe estoiram ao pé e de todos os lados correm caceteiros, em grita_

– Ó seu maroto!! ó seu talassa! Aqui é Republica!

Foi um milagre o José da Rita escapar e poder apresentar-se no dia seguinte no mercado de Freixo-de-Sabre-à-Rétaguarda. Chegar, armar a barraca e desfraldar de novo a bandeira republicada, foi obra de meia hora, finda a qual Freixo em peso lhe saltava no galinheiro aos vivas à monarquia …

À hora em que escrevemos, José da Rita, que percorreu mais sete feiras com êxito igual, está de vinha de alhos e o jumento satisfeitíssimo e bendizendo as perturbações políticas que ora afligem a sociedade portuguesa.

…eram outros tempos esses da minha infância. Tempos em que os homens rurais iam às feiras e às romarias munidos de varapau ou de pau-ferrado, para afugentar qualquer ladrão emboscado numa encruzilhada ou para lavar e repor a honra ofendida por ditos ou provocações. Sim, nesses tempos a honra tinha valor e quando ofendida, era lavada e reposta em acção directa e não, como hoje, com recurso por tudo e por nada ao tribunal, por bagatelas penais.

 Correia Marques em “A Paliçada” – 10 Out 2012

PT:
O vira costas é uma técnica essencial no combate contra vários adversários estando cercado. Pois este ataque, ao fazer girar o corpo numa volta, transfere essa energia horizontal para a arma, que abrange todas as direcções. No entanto, apesar desta multidirecção do ataque,  esta volta não é feita de forma descontrolada, mas sim direcionada para um dos lados, utilizando a tactica de gestão de espaço. Com cuidado podemos ver no clip, que o puxador se desloca sempre numa direcção, quando roda, e que antes de finalizar o ataque, a sua cara já está virada para onde vai atacar, sendo uma pancada feita com uma tomada de decisão conscientemente quanto ao alvo, com a vantagem extra, de a rotação da vara em torno do corpo oferecer alguma protecção.

EN:
The “turnaround” strike is an essential technique on combat against multiple opponents, specially when surrounded. With the turn of the body, the energy is transferred horizontally to the weapon, affecting multiple directions and opponents all around. however, this multidirectionality of the move does not mean it can be made without thinking. It is directed at a specific direction, with the tactic of space management characteristic of this fighting situation. With attention to the clip we can see that the fencer always moves in a direction, when he rotates, and that before he finishes the attack, his head turns first to face the direction of the attack, so he can make a conscious decision to where he is targeting his strike.

Bater atrás a uma mão. // Beating back at one hand.

Para afastar o adversário que está nas costas, ameaça-se com um ataque por cima, mas ataca-se baixo aos membros inferiores largando a uma mão, para forçar o adversário a recuar. Com a continuação do movimento de rotação do corpo, volta-se a cair ao adversário inicial com varrimenta.

To scare away the opponent on the back, threaten with a high strike, but release at one hand and strike to the lower body to force the opponent back. Then with the continuation of the rotation of the body, turn to the initial opponent with a sweep.

[youtube http://www.youtube.com/watch?v=36VI6Gr9gwA?feature=oembed&w=500&h=281]

Na continuação do vídeo anterior, Luis Preto demonstra como gerir dois ataques simultâneos utilizando a varrimenta de cima como defesa a avançar para criar espaço, forçando um adversário a recuar ao mesmo tempo que evita o ataque do outro adversário com o seu deslocamento.

[youtube http://www.youtube.com/watch?v=Ys3xw-O7YXU?feature=oembed&w=500&h=281]

Um principio básico da táctica de combate contra vários adversários, explicada por Luis Preto. Aqui com bastão, mas o principio é o mesmo da esgrima com varapau, de onde derivou, na nossa esgrima, a utilização do bastão ou bengala.

Classe de esgrima de pau no Real Colégio Militar

 

Cartão postal – Lisboa – Real Colégio Militar – Jogo do pau.

“Já em 1926, na festa final do Colégio Militar, uma classe de 450 alunos, sob a direcção do, hoje, Sr. Coronel Garcia Gomes, entoou uma vibrante marcha da autoria do … Era esgrima, era ginástica, era a equitação, era jogo de pau, era tudo.” – Revista militar, Volume 55,Edições 1-4

EN: “In 1926, the the final celebrations of the Military College, a class of 450 students, under the direction of Coronel Garcia Gomes, did a great show… With fencing, gymnastics, equitation, jogo do pau, it had everything.”


Esgrima de pau entre os exercícios praticados nas provas do ano lectivo de 1900-1901 pelos alunos do 6º ano do Real Colégio Militar realizado as 11 de Junho de 1901.
http://hemerotecadigital.cm-lisboa.pt/OBRAS/BrasilPortugal/1901_1902/N63/N63_item1/P22.html

Nova edição do livro de Luís Preto sobre combate em inferioridade numérica.

Neste livro, Luís Preto trata desta que é uma tradicional vertente do jogo do pau português, mas este livro não é apenas uma excelente descrição da historia e manual prático de uma arte marcial de origem portuguesa, como também pode ter uma aplicação bastante prática nos dias de hoje, devido à adaptação da técnica ao bastão ou bengala, que tem uma maior aplicação nos dias de hoje do que o tradicional varapau ou cajado.

“Desde os tempos longínquos das ferozes batalhas em campo aberto, à mais antiga forma de defesa pessoal, numa situação em que se tenha que enfrentar um gangue de assaltantes”

Juiz de Paz

Frei Bento Domingues, numa critica à violência no ser humano, contempla desde as grandes guerras entre impérios e nações, aos pequenos conflitos entre famílias e indivíduos, deixando-nos o exemplo local do jogo do pau português que ainda conheceu como forma de resolver conflitos. Felizmente, esta forma de combate, com varapau, já não tem essa aplicação pratica no contexto dos dias de hoje. Mas infelizmente a violência na sociedade, desde a confrontação bélica à violência doméstica, urbana etc, ainda faz parte da vida de muita gente. Fica assim um registo de como era antigamente, não há muito tempo atrás.

“Conheci, desde muito novo, a estupidez da violência entre famílias e aldeias vizinhas que chegavam a expressões sangrentas nas feiras e nas romarias da minha zona. O meu pai, “Juiz de Paz”, era de uma paciência sem medida para conciliações e reconciliações sempre efêmeras. Tinha de abandonar, muitas vezes, os trabalhos do campo para ir servir de mediador em desacatos em aldeias bastante afastadas. Nunca quis aprender o “jogo do pau”, jogo aparente e treino real para ajuste de contas.”

Frei Bento Domingues, O. P. in Público, 15.06.2014