"O senhor Ventura" – Miguel Torga
Um dia, porém, uns marinheiros americanos, de passeio, deram cabo daquela felicidade. Entraram, começara, a carregar no Porto, embebedaram-se, e ás tantas insultaram o minhoto. Sem saberem, coitados, que o Pereira, além de ser bom cozinheiro, sabia jogar o pau. Quando o viram surgir de cacete na mão, os do mar, fiados nas leis do boxe e na musculatura yankee, riram-se. Mas o Pereira cerrou-lhes os lábios duma assentada. Salta para o meio deles, malha daqui, torce dali, parecia que estava a varrer a festa de S. Bento da porta Aberta. Em menos de um fósforo tinha a casa limpa.
(…) E, como aparecessem novamente marujos americanos, o alentejano tentou apaziguar os ânimos, não consentindo que o Pereira arredasse pé das caçarolas. Mas os do Tio Sam vinham com ela fisgada. Queriam vingar os camaradas. E tanto disseram, tanto provocaram, que em dado momento o Senhor Ventura perdeu a cabeça e gritou lá para dentro: – Ó Pereira, anda aqui dar uma ajuda! – Caiu o Carmo e a Trindade. Um da direita e o outro da esquerda, ás cacetadas a eles, não deixaram cabeça sem sangue nem garrafa inteira.
“O senhor Ventura”, Miguel Torga, 1943 excerto em “O jogo do Pau em Portugal: processos de mudança”, Rui Simões, 1990.
O mestre José Ribeiro Chula
Foi com o mestre António Moleiro de Valdéra, um antigo discípulo de Domingos Miguel, que José Ribeiro Chula Júnior recebeu as primeiras lições de jogo do pau.
Tinha então 17 anos, conta hoje 34, é natural da Moita do Ribatejo e, presentemente, joga no Barreiro e em Alhos Vedros.
Durante a sua carreira de mestre e de jogador tem feito uma notável propaganda do jogo do pau, tendo-se exibido no Barreiro, Coina, Azeitão, Setúbal, Grândola, Loulé, Moura, Atalaia, Montijo, Moita, Alhos Vedros e em muitas outras localidades onde o seu jogo tem sido sempre aplaudido.
José Ribeiro, que segue a escola de Lisboa, é um magnifico jogador, e na sessão de jogo do pau que há três anos organizámos no Ateneu Comercial, teve ocasião de pôr à prova todo o seu valor da sua classe, assaltando com os mais categorizados elementos que tomaram parte da aludida sessão!
A sua escola «a pura escola de Lisboa», é de grande eficácia; no ataque serve-se habilmente do pau, manejando-o só com o braço direito, o que é próprio do jogo lisboeta, e as suas pancadas enviesadas são muito perigosas, mesmo para os jogadores mais cautelosos!
As suas passagens, tento para o lado direito como para o esquerdo, são feitas com perfeição, e os seus cortes, claros e precisos, notando-se em especial uma grande rapidez no corte saído!
(…) e as cobertas laterais são executadas com toda a atenção, tendo sempre o máximo cuidado com as mãos!
José Ribeiro Chula tem vários discípulos no Barreiro e os melhores são José Policarpo e Joaquim Cunha, rapazes ainda novos no jogo, mas que, pela sua habilidade, constituem verdadeiras esperanças.
José Ribeiro é pois um belo jogador e um grande propagandista da modalidade a que se dedica, o que prova pelo notável desenvolvimento que, na sua região, tem dado à esgrima portuguesa, ensinando inúmeros rapazes, e tomando parte de várias festas desportivas, em que o jogo do pau faz parte do programa.
Sebastião D. M. Cerveira.
António de Sousa e José Pereira do Tanque – Alunos de mestre Calado – 1985
Parte do trabalho de investigação técnico e histórico do jogo do pau liderado pelo mestre Nuno Russo, nos anos 80, com objetivo de encontrar os mestres mais antigos do país, levou na pegada dos mestres Calado, pai e filho que ensinaram em várias regiões desde os inícios do século XX, como mestres ambulantes.
Infelizmente pouco se sabe sobre os mestres Calado, com quem aprenderam etc…, mas sabemos que ensinavam por várias zonas do país e que na altura desta investigação, eram tidos com grande respeito por grande parte dos jogadores de pau e conhecidos como os mestres mais antigos, conhecidos, em várias regiões.
Nas imagens, temos José Pereira do Tanque (José Batoque) e António de Sousa, ambos alunos do mestre Calado (Pai) a executar e ensinar o jogo do pau, como aprenderam com este mestre.
Vieira do Minho – Terra de origem dos mestres Calado (Pai e filho) “Os pretos”
Fotos tiradas em setembro de 1985 por Henrique Andrade
Histórias que ainda se contam
Pio Pinto de Almeida, pedreiro, natural de Marecos, Penafiel, um dia, há mais de cem anos, foi à festa de São Gonçalo, Amarante. Ao chegar, viu um homem a bater na sua mulher. Decidiu «meter a colher» e assestou duas bordoadas nas costas do biltre. Familiares e amigos do marido agressor tentaram vingar-se, mas o justiceiro Pio lá se foi defendendo, pois era um exímio lutador de pau. Entretanto o número de defensores do cobarde foi aumentando e valeu a Pio uma alma caridosa que o acolheu e o salvou de um linchamento da arruaça. Este homem que arriscou a vida para lutar contra uma injustiça era meu bisavô, o que muito me honra.
Américo A. Campos – 20 May 2015
Herminius – 1893
“Esta «troupe» portuguesa, que vai a Chicago mostrar os nossos costumes e diversões, como toques de guitarra, fandango saloio e jogo de pau, apresenta-se no Coliseu dos Recreios, ás Portas de Santo Antão, no sábado próximo, 5 do corrente.A rapariga que baila o fandango é de Pataias, de onde é também um dos mestres do jogo de pau, o celebre Joaquim Agostinho. Dizem-nos, porém, que Gonçalves Dias, mestre do jogo do pau pelo sistema de Lisboa, é uma verdadeira maravilha.É espetáculo que muito deve entusiasmar o publico.”
1º Aniversário da APJP – Encontro Inter-Escolas – Fundação Calouste Gulbenkian – 1978
Escola do Mestre António Portela (Abadim, Cabeceiras de Basto)
Escola do Ateneu Comercial de Lisboa, Mestre Pedro Ferreira
Escola do Mestre José Quéo (Fafe)
Escola do Mestre José Ribeiro Chula (Vinha das Pedras, Alhos-Vedros)
Escola do Mestre Custódio das Neves (Lagameças, Poceirão, Palmela)
Escola do Mestre António Moleiro (Fafe)
Escola do Mestre Costa do Assento (Fafe)
Entretanto há 111 anos, tourada em Sintra com exibição de jogo do pau!
http://hemerotecadigital.cm-lisboa.pt/OBRAS/BrasilPortugal/1906_1907/N182/N182_item1/P12.html
Mestre António Portela a orientar demonstração
Parte da demonstração da escola do Mestre António Portela de Abadim, Cabeceiras de Basto no 1º aniversário da Associação Portuguesa de Jogo no Pau na Fundação Carlouste Gulbenkian – 1978
Ateneu Comercial de Lisboa, uma demonstração de jogo de pau
Identificados no álbum: Aurélio Cunha; Joaquim Madeira. – 1937