O sino repica alegremente, a musica vibra triunfante, os morteiros fazem estremecer os alpendres! E a procissão que vai dar volta ao cruzeiro, mas que dificilmente poderia romper o enorme agrupamento humano, se o Zé Pereira, um danado para estas coisas, não abrisse caminho com as suas evoluções fantásticas! Ai vem um andor, bravo! nem o pinheiro mais alto, e todo engalanado a plumas, a galão de ouro, a pequeninos espelhos refulgentes! Que riqueza de ouro levam os anjinhos! O pallio, o pallio! Vão os mesarios ás varas; a custodia, nas mãos tremulas do abade, cintila fulgurações radiantes. De joelhos, de joelhos! Que sol de rachar! Vá mais uma melancia ali á sombra de uma carvalha; venha de lá essa borracha para que não vá pesar pelo caminho! Confusão, tumulto lá para um canto, varapaus no ar! Ajuste de contas entre ciumentos, vinho, vinho é que é! Alas a coisa é seria! A bordoada ferve, os ânimos exaltam-se, o rapazio foge, as mulheres gritam! … Santo Deus, que vai ai o dia de juízo! Boa romaria faz, quem na sua casa está em paz! Olha agora por causa de uma mulher, como se não houvesse muitas neste mundo !
A romaria desfaz-se, o formigueiro humano retira amolentado e exausto. E também o sinal que o sol espera para mergulhar no poente por entre um esbrazeado de nuvens, e o que a lua espreita para se erguer afogueada no fundo pérola do céu.
“O Minho Pittoresco” – José Augusto Vieira – 1887