O Cavaleiro e o Peão

É curiosa esta época ( séc. XIII / XIV ), pela porfiada luta, travada entre o armamento do cavaleiro e o do peão. Este ultimo não podendo equiparar-se ao primeiro na armadura, já pela escassez de meios, já pela necessidade de conservar a agilidade indispensável para as marchas e para combater a pé, desforrava-se nas armas de arremesso, e ainda mais nas de fuste, as quais nesta época passam por uma verdadeira transformação.

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Principia aqui essa longa serie de armas formidáveis nas mãos vigorosas da peonagem rude — armas que tiveram todas a sua esgrima especial, e de cuja eficácia poderá julgar o leitor que tiver, em algumas das nossas feiras ou festas campestres, visto como o guapo valentão sabe varrer o terreno, abrindo caminho com os sarilhos do seu varapau.

“Armaria” – 1885 David Corrazi – Editor.
https://archive.org/stream/armariaillustrad00lisb

Deslocamento em jogo / Body displacement in freeplay

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Sequencia de 6 defesas e contra ataques / Sequence of 6 parry and  counters

PT:
Como podemos ver na imagem, o descolamento do corpo em jogo livre deve ser constante, havendo sempre um ajuste da distancia na defesa, sendo que o ataque é sempre realizado para bater. O jogador que ataca, avança para chegar ao alvo, mas o que defende recua, mantendo-se seguro. Esta não é uma regra absoluta, pois quem defende pode conseguir defender no lugar ou mesmo a avançar, mas este deslocamento base, permite uma maior segurança, e é o mais comummente utilizado.

Quando se vê o video normalmente, pode parecer que as varas so tocam uma na outra e que se esta a atacar para o ar. Isso seria verdade se não houvesse deslocamento, mas neste caso podemos ver que os ataques são feitos para o corpo, e é o constante deslocamento que permite uma defesa segura.

Note que deslocamento do corpo não é apenas deslocamento do pé, é possível mover o pé sem quase mexer o corpo, mas o que se quer aqui é deslocar tanto o corpo como o pé.

EN:
As we can see in the image, the movement of the body is constant in traditional freeplay, there is always an adjustment by the defender, and the attack is done to reach him. The fencer that attacks moves forward to reach the target, but the defender retreats back, keeping a safe distance. This is not a “rule of the game”, the defender could stay in place or even move forward when parrying if he had the skill for that, but this displacement allows more safety and is the most commonly used.

When the video is played normally it might look like the fencers are striking out of range and only hitting to the staffs. That would be true if they didn’t move their body and just stayed in place hitting out of distance, but this is not the case, since the strikes are made to the target and the body displacement of the defender is what creates the safe distance.

Note that body displacement is not the same as just footwork, it is possible to move the feet without barely moving the body, that is not what we see here, what is done in jogo do pau is the displacement of the body as much as the feet.

Brás Garcia de Mascarenhas

Em 1922, António de Vasconcelos, coloca o personagem histórico Brás Garcia de Mascarenhas(~1640), a ser auxiliado por valentes jogadores de pau. Os mesmos jogadores de pau do tempo de António de Vasconcellos, que pela descrição do texto os deve ter visto e conhecido no seu tempo, como bravos varredores de feiras. Para o autor, neste “estudo de investigação histórica”, pareceu-lhe razoável inserir jogadores de pau cerca de três séculos antes, num tempo e local onde esta prática faria o mesmo sentido que ainda tinha no inicio do século XX.

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(Brás Garcia de Mascarenhas)

Chega o dia indicado para a posse e banquete do intruso prior de Travanca.

Brás Garcia, acompanhado de alguns amigos armados com as suas espadas, e provavelmente levando consigo alguns criados, bons jogadores de pau, munidos de cacetes, constituindo todos uma pequena guerrilha de muy poucas pessoas, saem muito em segredo de Avô pela madrugada, e percorrem, com as devidas reservas e cautelas, os trinta e tantos quilómetros que, pelos caminhos velhos, medeiam entre Avô e Travanca. Teem o cuidado de se desviar dos povoados e de evitar que sejam vistos. Chegados a Travanca, cortam a direito em direcção à igreja, sem serem avistados da povoação, e surgem inesperadamente junto do presbitério, ao pé da carvalha que descrevemos.
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O acto da posse litúrgica havia de realizar-se pela tarde, depois do banquete, e este encontrava-se no seu auge. Aos ouvidos de Brás e dos companheiros chegavam as manifestações da ruidosa alegria dos convivas, e facilmente se notava que eram em número muitíssimo maior do que os que constituíam a guerrilha. Ouvia-se alem disso o vozear da gente do povo e da criadagem, que do outro lado da casa, no páteo da residência e no contíguo adro fronteiro ao templo, enquanto esperavam pela festa da igreja, com seus folgares ruidosos iam fazendo coro aos vivas e brindes que partiam da sala de jantar.

Torna-se pois complicado o caso. Acometer toda essa gente, embora de surpresa, seria um acto de louca temeridade.

Mas era tarde para hesitações, e Brás não era homem que recuasse. Não espera por mais.

Como um furacão entram todos pela porta dentro, e de espada em punho uns, outros de cacetes erguidos, caem sobre os convivas espadeirando-os e contundindo-os. Alguns conseguem saltar pelas janelas e pôr-se em fuga ; outros resistem, mas debalde. Uma confusão medonha, um motim infernal. Pelo chão, por baixo da mesa, rolam corpos feridos gravemente, jazem outros sem movimento.

Alguns dos convivas haviam-se escapado do presbitério para a que dá acesso por esta banda ao páteo da residência prioral. Esta fica por trás da carvalha ; e lá ao fundo, na extremidade da direita, descortina-se o telhado e parede da igreja, onde supuseram encontrar asilo inviolável. Faliu-lhes o cálculo. Ali mesmo foram feridos e espancados, ficando assim poluída a casa do Senhor, que ipso facto se tornou inapta para a celebração dos actos cultuais. Esta a explicação que tem o caso de encontrar-mos nos últimos meses de 1640 fechada ao culto a igreja paroquial de Travanca, e os ofícios divinos, que nela deviam realizar-se, a serem celebrados na igreja de Farinha-Podre, hoje S. Pedro de Alva.

Quando toda a resistência dentro de casa tinha acabado, os agressores descera ao páteo, para dali e do adro varrerem a populaça e criadagem. Então é que iam mostrar a sua valentia e a sua agilidade e perícia no jogo do pau os caceteiros do rancho, que levariam deante de si centenas de pessoas que lá estivessem. Mas quê ? Não encontraram ninguém. O pavor tinha-se apoderado de toda essa gente. Apenas ouviram os primeiros gritos de sobresalto e dor, acompanhados do tenir de ferros na sala de jantar, apenas viram os primeiros fugitivos saltarem das janelas e pôr-se ao fresco numa carreira desordenada, um pavor colectivo se apoderou deles, e, não esperando o próximo momento de entrarem em função, deixaram o adro e o páteo desertos, num abrir e fechar de olhos.

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“Brás Garcia Mascarenhas; estudo de investigação histórica” – António Garcia Ribeiro de Vasconcelos – 1922

O jogo do pau na história do Soajo aos quadradinhos; in english!
(“The Judge of Soajo”, texto e desenhos de José Ruy, Editorial Notícias)

Disponível à data em:
http://www.fnac.pt/O-Juiz-de-Soajo-Jose-Ruy/a807684

“A história, os costumes e as tradições da vila de Soajo, em Arcos de Valdevez, são preservados pela mão de José Ruy, o autor português de banda desenhada com mais álbuns publicados. A propósito da comemoração dos 500 anos do Foral de Soajo, a Âncora Editora reedita uma obra de valor inestimável pelo registo do rico património cultural, paisagístico e patrimonial desta aldeia singular, outrora sede do concelho.”

Se esgrime el palo en la provincia de Santander y montañas de Leon, en el principado de Astúrias y en algunas comarcas de Galicia.
En Francia en Auvernia y en el Franco-Condado.
En Portugal en la Beira alta e baja.

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“Arte de esgrimir el palo” Liborio Vendrell y Eduart – 1881

A guarda do jogo do pau com a perna da frente dobrada, logo, com o peso na frente, não é uma invenção moderna ou adaptação de artes orientais.

Esta guarda é utilizada desde à séculos em várias formas de esgrima, inclusive na mais moderna esgrima olímpica, e como se pode ver, era também utilizada com vários tipos de armas, de curtas a longas, a uma ou duas mãos. Podendo haver algumas exceções, em algumas artes, ou situações que em o peso é colocado de outra forma, é no entanto a norma, a postura mais comum.

Rancho Fol Varziela Felgueiras: O jogo do pau era comum em todo o país,isto já e replica,no fim da missa,na feira,na desfolhada,espadelada fracas seriam se não houve-se paulada que acabaram proibir o uso do pau!!!

Fernando: em qualquer lugar do Norte esta tradição era comum…A famosa richa que os de Soajo travaram na feira dos Arcos de Valdevez com os de Prozelo é lendária…e tendo os de Soajo perdido, um dos seus deixou o pau…no dia a seguir, corajoso foi a Prozelo, sozinho, buscar a sua vara.
Um meu tio-avô varria a feira de gado dos Arcos, desde o alto de São Bento até ao largo da Lapa, levando, com um pau, tudo à sua frente
E na festa de Santo Lenho de Grade, cada qual guardava o seu pau nas vendedeiras de doces e nas tabernas…chegada a hora do desacato, quando o vinho chegava ao cérebro, cada um ia ao respectivo local buscar a sua vara e assim terminava a festa, como todas, à paulada…